sexta-feira, 17 de maio de 2019

O CREPÚSCULO DE SERGUEI



   Entrando direto na ferida ... Desde 1999, quando fui para a casa dele (a então lenda viva do rock), em Saquarema, no Rio, algum tipo de "limitação" já rondava seu cérebro marcada por um coagulo (sofrera um acidente de moto anos antes). Óbvio que eu não podia esperar outra coisa. Ele tinha momentos de "apagão" graças a uma amnésia crônica que comprometia, entre outras coisas, possíveis intercâmbios culturais. Era comum, desde o período acima mencionado: troca de nomes de músicos (os quais acompanhavam-no no vocal principal, em diferentes épocas), ataques de estrelismo (inclusive diante de circunstanciais patrocinadores), inferno astral de bastidores (leia-se solidão camuflada por ego inflado), e etc, etc e etc. Eu sei que tem muito artista da história que só passou bons momentos com Sérgio Augusto Bustamante e não pode ir fundo numa análise e, assim sendo, irá defendê-lo até o fim (afinal, poucos compreenderão a real essência de sua trajetória quando trago à tona a realidade dos fatos). São situações as quais fui testemunha ocular presencial.
  Apesar de Serguei ser mais uma vítima de um Brasil ainda subdesenvolvido, que pouco oferecia oportunidades a estrelas de "determinado" carisma, porém, decadentes, isso não isentava da preguiça de entrar no estúdio para gravar. Serguei teria mais valor se, por exemplo, tivesse gravado material autoral tal como o não menos decadente rocker, Iggy Pop), . Em tempo: o termo "decadente" aplicado ao ídolo internacional refere-se a algo positivamente heroico realizado na trincheira do rock. Detalhe: Em entrevista concedida em 2011, o roqueiro gaúcho Edu K. chamou Serguei de Iggy Pop brasileiro. Se tem uma coisa que Serguei nunca se espelhou foi nesta lenda vida citada. Serguei, a bem da verdade, foi a personificação moderna de Dom Quixote no mundo pop juvenil. Com poucos acertos e muitos erros. E olha que, hoje, em solidariedade ao velho amigo, estou sendo "chapa branca".
  Pois bem... Cabe ressaltar que a parte nociva, para que conste nos autos, é que, de fato, saíram dois livros sobre o folclórico amigo e ambos sem cronologia (pra variar). O primeiro bem intencionado encomendado por João Henrique Schiller, que contratou um ghost writer para fazer o trabalho. O segundo (que prefiro não fazer propaganda) omite personagens fundamentais e bandas que foram decisivas em vários momentos da irregular carreira de Serguei, tais como The Youngsters, The Cougars, Boca Roxa Blue Band, Makina Du Tempo, Metamorphose, Bruxa de Pano, Pandemonium, entre tantas outras muito relevantes. E, por último, o livro omite suas passagens com os fundadores da banda Made in Brazil e sua "quase" frutífera amizade com Carlos Loffler, misto de ator e roqueiro (para alguns, apenas o neto do Oscarito). Recentemente, coisa de dois anos atrás, Serguei declarou, aos quatro ventos, que Carlos Loffler era seu possível sucessor (!) ao trono (?). Na categoria hippie, o então jovem (Loffler) absorveu o rock ainda nos anos 1970 (mas essa história fica para outro dia). Nos anos 1980, trabalhou num musical em longa-metragem, "Trop Clip", ao lado de Marcos Frota e grande elenco, além do filme de Roberto Gervitz, "Feliz Ano Velho", porém, sua carreira, no sentido de difundir o rock sempre ficou limitada ao teatro ("Isto é Rock and Roll"). Assim como Serguei, Carlos Loffler descobriu o charme de ser "underground" e herdou a mesma face quixotesca do "ídolo" em questão. O insucesso de um artista numa área pode variar de acordo com a óptica. O que é conquista para uns é nada mais que retrocesso para outros. Em suma, o êxito de Serguei é justamente ter se tornado uma figura cultuada pelas tribos independentes do rock após ser recusado pelo mainstream. E, muitas vezes, o folclore predominou e superou o perfil de "mito".
  Retomando  a cronologia pessoal da "Bíblia do Rock"... Pois bem. Embora eu estivesse documentando e colhendo material da maioria dos pioneiros do rock (sem excluir nenhum nome), presenciei muitos oportunistas e sicofantas tirando proveito da sua inigualável figura. É de conhecimento público que Serguei, em sua busca incansável pelo sucesso nas paradas, pelo menos de 1966 até meados de 2010, nunca soube ser seletivo em suas parcerias. Pior... Deu abertura, no meu entender, para gente que não merecia nem um aperto de mão. Olha só... Um livro (recente) que se vende na praça como "a biografia definitiva de Serguei" (longe disso) é prova de que nunca soube trabalhar bem sua imagem como artista (mesmo se tratando de uma personagem que sempre soube circular desenvoltura tanto no underground quanto no mainstream, no caso o Rock in Rio III, em 1990). Para quem se interessa pela personagem não se deixem em enganar por biografias tipo caça níquéis, que são escritas por fofoqueiros de plantão que só entendem mesmo de telenovelas ou sites de rock da moda. (Pra começar, Janis Joplin morreu em 1970 e não em 1971, ok, Jornal Zero Hora?). E, por fim, vamos parar com essa mania de incentivar esses livros picaretas com entrevistas transcritos, exceto que os mesmos alternem texto narrativo com depoimentos. Lançar somente um livro gravado em uma única entrevista revela acomodamento sistemático em nível jornalistico. E rock é tudo menos "sistema", concordam?



   Pois bem... Sobre a tal doença, declaro (sem alto e bom som, pois aqui é um texto destinado ao blog) que Serguei está em estágio inicial de doença degenerativa há muito tempo. O tempo que o roqueiro e amigo se hospedou na minha casa na capital gaúcha já ocorriam esses momentos de anemia, desnutrição por indisciplina e pane de memória. O problema é que, decisivamente, a idade avançou ainda mais. Outra questão que envolve a saúde de Serguei é que todas as pessoas contratadas para cuidar dele (pagas ou gratuitas) não duravam muito. Só sabe disso quem conheceu Serguei na intimidade, pois tivemos uma amizade duradoura (sem malícias), tour de shows pelo sul do país, exposição em vários programas de TV e rádio da mídia oficial, etc. No caso, por causa da BÍBLIA DO ROCK, como todos que me conhecem, sabem que fiquei anos documentando a história de Serguei, colhendo material audiovisual raro em vão para logo em seguida ele fazer um pacto com uns picaretas que se adiantaram e lançaram um documentário com erros de datas, locais e fatos sem fontes confiáveis. Quem tem pressa come crú e o documentário não repercutiu apesar das personalidades interessantes terem apoiado. Serguei merecia muito mais, mas não soube esperar.



   Todos nós determinamos nossas trajetórias de acordo com nossas ações. O corpo e a mente devem ser tratados de forma sagrada, a arte de se expressar tem seus limites quando a saúde pede para ficar em primeiro plano. Contudo, SERGUEI nunca se meteu com drogas pesadas ou álcool. Seu maior vício era cultivar amizades com garotos (na promessa de um dia isso virar outra coisa.) De tudo que pude acompanhar pessoalmente, até 2000, essa bobagem de afirmar que era adepto da PANSEXUALIDADE nem marcava ponto na mídia (surgiu de um improviso durante uma entrevista no programa Jô Soares). Lembro do show que fizemos com ele em Limeira, interior de São Paulo, onde o alto astral verbal dava mais espaço que essas frases de efeito para chamar atenção da mídia. Se a partir desse momento, seu nome chegou a integrar até um ensaio sensual na TRIP foi graças a divulgação que fiz via BÍBLIA DO ROCK no eixo Rio-SP. Eram tempos sem a força que a internet possui hoje. E vejam só... Muitas histórias eu teria para contar num livro sobre os bastidores da música jovem, tais como os pioneiros que conheci - dos anos 1950 para cá - tais como Celly Campello, Sérgio Murilo, Carlos Gonzaga, Tony Campello, Demétrius, George Freedman, Bobby Di Carlo, Baby Santiago, Hamilton Di Giorgio, Renato e seus Blue Caps, Albert Pavão, Jerry Adriani, entre muitos, inclusive bandas, produtores, comunicadores. musas e groupies. Porém, era certo que, neste pacote todo, acabaria entrando o Serguei. (imagine só... Tudo documentado no plano audiovisual disponível para virar filme). Se fosse nos EUA, o projeto já estaria pronto, decolando nas paradas de sucesso.



   Enfim... Pois então... para finalizar... Espero que, apesar dos pesares pesando, SERGUEI se recupere, claro, porém, somos reféns da deterioração biológica. Receio que num futuro próximo teremos que nos preparar para uma má notícia. E... Uma coisa para descontrair: Nos anos 2000, tempo que a BIBLIA DO ROCK teve uma boa exposição na mídia pré-internet, lembro que, ao contrário do que fofocavam em 1999, eu nunca comi o Serguei (eu, heterossexual convicto, saía com algumas adolescentes que moravam no centro de Saquarema) e se ele comeu ou não a Janis Joplin posso dizer apenas o que eu ouvi através de depoimentos de terceiros, como por exemplo, o do baterista que tocava na boate do Leme em 1970 e viu a cantora (Joplin) adentrar o local como uma ilustre desconhecida. Sem mais é isso, por enquanto. Qualquer duvida leiam a matéria anterior que publiquei no blog. Desejo vida eterna a todos que acreditam no outro plano (o espiritual). O verdadeiro sentido da vida é acreditar que a vida faz sentido.




(EMERSON LINKS para a BÍBLIA DO ROCK).


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