segunda-feira, 11 de setembro de 2017

GEORGE FREEDMAN, UM DOS PIONEIROS DO ROCK NO BRASIL E ÍDOLO DA JOVEM GUARDA.





Muito antes de iniciar o projeto A BÍBLIA DO ROCK, eu já conhecia esse pioneiro do rock and roll, através de discos em sebos, pois minha atração pela época, anos 1950 e 1960, vinha desde o berço. Era algo que eu sentia falta em minha geração. O visual atraente dos anos dourados, da arquitetura, dos figurinos, dos automóveis e da música como um todo ocuparam um grande espaço em minha mente. Sempre gostei de várias fases do rock and roll, porém, por muito tempo eu me sentia refém, no bom sentido, de uma época sem igual. Como minha primeira paixão foi o cinema, procurei me profissionalizar na área para um dia realizar um filme digno de Primeiro Mundo e não somente realizar um documentário imediatista onde cada personagem tivesse sua carreira resumida em 5 minutos, queria mesmo esmiuçar mesmo me faltando muito material físico. Nosso país, como se sabe, tem pouca tradição em preservar a memória cultural e quando isso ocorre, sempre se encontra uma colcha de retalhos incompleta ou um quebra-cabeças sem fim. Em 1999, finalmente, adulto, tomei a iniciativa de adquirir equipamento ("professional"), abandonar a carreira de ator e dramaturgo no teatro, para viajar o país à la "on the road" captando depoimentos de artistas de todas as épocas. Confesso que não esperava demorar tanto para finalizar o projeto e que para alcançar a marca dos mil novecentos artistas documentados levaria tanto tempo. Quem tentou fazer algo parecido, antes de mim, garanto que o fez de forma resumida porque para quebrar tal marca precisaria de mais anos à frente(afinal de contas são 62 anos de rock brasileiro e não apenas 50 ou 30, como algumas publicações de completa desonestidade jornalistica tentam empurrar no público leigo). Algumas editoras chegaram a comprar a ideia de um moleque que criou uma narrativa fantasiosa sobre o surgimento da cena rockabilly argumentando que o rock verdadeiro havia surgido somente nos anos 80, em São Paulo, através da banda Coke Luxe. E olha que nem estou recapitulando, aqui, outras obras ou documentários que constantemente forjam uma nova narrativa das origens do rock, dizendo que este iniciou com o Brock. A falsa narrativa não apenas desinforma os leitores da nova geração, como também, compromete obras honestas de futuros pesquisadores. Numa época de bombardeio de informações e muita lenda urbana na internet, o recurso lógico é pesquisar as fontes consideradas verdadeiras e com quem realmente viveu os anos dourados do rock and roll ou de quem participou de tal época e concede uma entrevista autêntica a você. Sempre respeito quando alguém toca no mesmo tema que eu recontando a história de forma honesta como os livros de Albert Pavão, Ricardo Puggiali, Kid Vinil, entre outros. 
  Sobre eu pesquisar 62 anos de rock em quase 20 anos de estrada (tinha 13 quando comecei), só posso dizer que busquei, sob uma chuva de críticas de imediatistas, o máximo de honestidade na reconstituição de época. De adolescente convivendo com cantores de rock que tinham idade para ser meus pais e meus avós, cheguei a fase adulta, sem nenhum arrependimento da jornada que abracei. Tive a sorte, em tempo, de conhecer pioneiros do rock que, hoje, não estão mais aqui, porém, deixaram em meu acervo audiovisual um grande legado. Foi um grande prazer ter convivido, não apenas entrevistando, esses grandes nomes que iniciaram o movimento de música jovem no Brasil. Passaram por mim: Celly Campello, Sergio Murilo, Tony Campello, Carlos Gonzaga, Eduardo Araújo, Renato e seus Blue Caps, entre outros. Ao contrário do que se recorda o nobre amigo George Freedman não foi em 2015 nosso grande encontro. Talvez, ele não se lembre, mas foi no inverno de 1999 que eu o visitei em sua residência pela primeira vez (questão que pode ser comprovada numa foto vintage logo abaixo, quando eu era um menino). Lembro, também, neste período, que Demétrius foi muito solidário quando sugeriu o meu nome para o Programa Flash, de Amaury Jr., na Band. Infelizmente, nesta noite de entrevistas tivemos apenas Os Golden Boys. Era para termos quase todos os nomes da jovem guarda reunidos e que não puderam comparecer. Dias depois, visitei um a um dos pioneiros. Entre eles, George Freedman que, hoje, divido este momento com vocês nesta entrevista histórica e exclusiva. Esperem que gostem.        


George Freedman, no final dos anos 1960.




                                                    A ENTREVISTA


EMERSON LINKS:

O que o rock representa para você?

GEORGE FREEDMAN

O símbolo de uma era que veio para ficar. O início de minha adolescência. A lembrança, em cada momento de uma apresentação musical, de uma época considerada pelos estudiosos – “anos dourados”. Um tempo maravilhoso onde a droga não tinha espaço; a violência não trazia o terror e, o amor e respeito entre os seres ainda existia.

EMERSON LINKS

O que o rock representou para a história da sociedade, através dos tempos?

GEORGE FREEDMAN

Representou o movimento de uma juventude que procurou se livrar dos conceitos e preconceitos de uma época conturbada do pós-guerra, procurando a liberdade de expressão por meio da música e da rebeldia dos costumes.



EMERSON LINKS

Quando, onde e como você ouviu rock and roll pela primeira vez?

GEORGE FREEDMAN

Ouvi o “rock” pela primeira vez em um rádio galena, em 1955. Tinha 14 anos e morava em um internato onde estudei até completar o ginásio ( hoje, primeiro grau).



EMERSON LINKS

Quais foram suas influências nacionais no que diz respeito a intérpretes e bandas?

GEORGE FREEDMAN

Foram como um relâmpago para a comunicação da época. A juventude, da noite para o dia, seguiu o movimento internacional, principalmente após a exibição do filme “A ronda das horas” (Rock around the clock”. Logo após, surgiram os primeiros intérpretes e bandas, entre eles, Carlos Gonzaga, Tony e Celly Campello, etc.









EMERSON LINKS

Qual foi sua primeira experiência amadora e profissional?  A sua família era conservadora?  Faça um relato de suas memórias da época. Fale também do contato com seu primeiro instrumento musical (no caso de cantor, falar do seu progresso vocal, ou do seu primeiro trabalho em programa de rádio ou gravação de disco, no caso você seja comunicador ou produtor de discos com bandas). Conte, de forma sintética, como tudo se desenvolveu...

GEORGE FREEDMAN

A minha primeira experiência como amador foi na TV tupi, dublando músicas de sucesso internacional num programa denominado “Seleções Americanas”, produzido e apresentado pelo Mr. Fisk e, posteriormente, num show em um cinema lotado, em Porto Feliz, interior de São Paulo, onde cantei músicas de Elvis Presley, apenas acompanhado de meu violão. Já como profissional, foi ao vivo, na televisão Tupi , na época, o canal 3; como quase todas famílias daquele período, a minha também era conservadora, e foi muito difícil convencer minha mãe a assinar meu primeiro contrato profissional. Pena ela não ter vivido para ver o desenrolar de minha carreira; Para relatar minhas memórias nesta entrevista, como você pede, eu poderia escrever um livro pois, com certeza, vivi o período intensamente; Meu primeiro instrumento musical foi a gaita de boca e depois o violão. Esta tendência musical já se manifestava desde minha infância; Gravei meu primeiro disco no selo “Califórnia” – uma versão intitulada “Hey litle baby”. Na época conheci o Tony Campello, meu amigo até hoje, que muito me incentivou para me profissionalizar.



EMERSON LINKS

A Bossa Nova foi um movimento antagônico ao rock and roll?

GEORGE FREEDMAN

Não. Acho que foi a evolução da MPB.



EMERSON LINKS

A Jovem Guarda foi um movimento importante para o rock nacional?

GEORGE FREEDMAN

Com certeza! Principalmente porque entrávamos na era da ditadura e, a Jovem Guarda trouxe um pouco de amor e esperança para um juventude que se viu forçada ao silêncio, não podendo expressar seus pensamentos.



EMERSON LINKS

Pergunta relacionada ao movimento Tropicália (ou Tropicalismo). Você acredita que o rock modernizou a MPB, acrescentando as guitarras elétricas nas canções, que antes era uma atitude proibida pelos tradicionalistas?

GEORGE FREEDMAN

Todo movimento musical influencia outro, assim como toda cultura é influenciada por outra, portanto tudo é característica de uma época; é a assinatura de um movimento musical e cultural.


EMERSON LINKS 

Alguns ingredientes do rock nacional ajudaram a moldar a MPB experimentalista dos anos 1970?

GEORGE FREEDMAN 

A MPB experimentou um período evolutivo, influenciado por diversas razões e episódios que o país atravessou e, as características das músicas, evidentemente, deixaram fortes traços de influência nacional e estrangeira.


EMERSON LINKS

Se você teve uma carreira ou vivenciou os anos 70, qual era sua opinião sobre o movimentos de bandas do rock progressivo?

GEORGE FREEDMAN
 
Minha última gravação foi em 1970, aliás, uma despedida honrosa de um sucesso que gravei com a Waldirene – “Eu te amo, tu me amas”. Depois eu me desliguei, temporariamente, da música e pouco acompanhei os movimentos posteriores.


EMERSON LINKS

Na década de 70, surgiu uma onda onde os produtores de gravadoras desejavam revitalizar o espaço do pop rock brasileiro comercial, fabricando intérpretes (muitos “fantasmas”), que apareciam em discos cantando em inglês; Era os casos de Mark Davis (Fábio Jr.), Morris Albert, etc... Quais são suas lembranças desse período, ou seja, você era contra ou favor?

GEORGE FREEDMAN

Nada tinha contra essa ideia. Até acho que foi o início da profissionalização da produção, inovando formas de faturamento. Um exemplo foi o estrondoso sucesso internacional de Morris Albert.

EMERSON LINKS

A onda da Discotheque iniciou uma crise no rock mundial e, por consequência, atingiu o Brasil?

GEORGE FREEDMAN

Todo movimento tem seu período. Uns mais longos e outros mais curtos mas, o verdadeiro e marcante movimento sempre consegue superar todas fases críticas.



EMERSON LINKS

Você acha que o movimento punk revigorou a cena roqueira (nacional) desafiando a Discotheque?

GEORGE FREEDMAN

Não necessariamente. Cansados da repetitividade, um movimento se destacou sobre o outro revitalizando e trazendo novas mensagens.

EMERSON LINKS

Por que o Heavy Metal sempre teve pouca penetração nas rádios brasileiras?

GEORGE FREEDMAN

Em minha opinião, por ser um música pesada de se ouvir. Se torna mais atrativo em uma apresentação ao vivo.



EMERSON LINKS

Você acredita que o movimento New Wave ajudou a estimular o rock nacional dos anos 80?

GEORGE FREEDMAN

Como todo movimento, este também trazia características de influência de movimentos anteriores e, portanto, um ajuda o outro.

EMERSON LINKS

No papel de compositor, quando foi que você atingiu o seu auge? Houve uma realização artística ou financeira?

GEORGE FREEDMAN

No final dos anos 60 foi meu melhor período como compositor, quando diversos profissionais gravaram minhas músicas e versões.



EMERSON LINKS

O disco mudou a sua vida economicamente a sua vida ou foi uma opção prazerosa?

GEORGE FREEDMAN

No meu tempo o disco não dava independência econômica para ninguém. Um sucesso de parada vendia pouco mais de 60.000 discos (compacto simples) e, um disco de ouro era conseguido com a venda de 100.000 discos. Hoje, um sucesso vende facilmente 500.000 a 1.000.000 de discos (CD’s), que rendem muito mais, conseqüentemente, minha época foi maravilhosa de ser vivida porém, péssima economicamente. Recentemente, infelizmente, tivemos provas do que estou dizendo.



EMERSON LINKS

Conte uma história marcante, que você tenha vivenciado com uma fã.

GEORGE FREEDMAN

Todos meus momentos com minhas fãs foram marcantes. Eu as amava. Tinha prazer em responder suas cartas pessoalmente e, quando as conhecia, era bárbaro.

EMERSON LINKS

Você concorda com essa supervalorização que a mídia faz do rock nacional dos anos 80?

GEORGE FREEDMAN

Porque não? Foi uma forma de revitalizar um dos movimentos mais marcantes da música internacional.

EMERSON LINKS

O movimento Grunge de Seattle (anos 90) foi importante para o rock nacional?

GEORGE FREEDMAN

Desculpe minha ignorância mas, este não acompanhei.

EMERSON LINKS

Descreva os intérpretes e bandas que você considera mais importante na história do rock (nacional e mundial).

GEORGE FREEDMAN

Como intérpretes nacionais cito Carlos Gonzaga; Tony e Celly Campello; Demétrius; Ronnie Cord, e no cenário mundial, Elvis Presley; Paul Anka; Neil Sedaka; Litle Richard; Jerry Lee Lewis, entre outros. No âmbito das bandas nacionais posso citar The Clevers (Os Incríveis); The Jet Black's; The Jordans e, internacional, a mais importante foi a banda The Ventures.



EMERSON LINKS

Quem é o Rei do Rock nacional?

GEORGE FREEDMAN 

Hoje muitos se intitulam e poucos receberam o título. Deixo a critério dos estudiosos do assunto descobrir.

EMERSON LINKS

Quem é a Rainha do Rock Nacional?

GEORGE FREEDMAN

Sem medo de errar: Celly Campello.



EMERSON LINKS

Qual a contribuição da música de Raul Seixas para a história do rock nacional?

GEORGE FREEDMAN

Raul Seixas foi um fenômeno à parte no cenário nacional. Ele personalizou o rock a seu estilo e demorou para ser reconhecido pela crítica. Sua contribuição foi grande, especialmente, pelas suas interpretações, trazendo mensagens inovadoras para a época.

EMERSON LINKS

Até que ponto as drogas exerceram um influente papel no trabalho musical dos roqueiros? (Exemplo: Tanto os Beatles quanto os Stones usaram LSD, em uma determinada fase de suas vidas para gravar um disco).

GEORGE FREEDMAN

A droga exerce um papel ilusório, tanto é que, na história universal, não me lembro de nenhum grande personagem que deixou algo substancial sob o efeito de drogas.


EMERSON LINKS

John Lennon já dizia: “O Sonhou acabou”. Com base nisso, você acredita numa nova geração de rebeldes ou a humanidade caminha para a robotização do prazer alheio?

GEORGE FREEDMAN

Sem dúvida, a robotização, a informática e a realidade virtual deverão mudar, substancialmente, a humanidade mas, todos momentos de transição levam a algum tipo de evolução e creio que “Este sonho acabou, mas outros virão”.

EMERSON LINKS

O romantismo perdeu sua essência frente a uma geração que não produz mais música para dançar de rosto colado? (Questão voltada ao pop rock e não para a música brega e vulgar). Por esse motivo não há mais espaço para o romantismo como havia no rock dos anos 50 e 60?

GEORGE FREEDMAN

Realmente, as coisas mudaram. O romantismo não é mais o mesmo, a época é outra. Hoje, os valores são outros. Porém, tudo tem seu período, cedo ou tarde alguns valores voltarão a ser valorizados e, no futuro teremos uma mescla do que foi e do que é.



EMERSON LINKS

Essencialmente, o que difere o rock e o pop feito de norte a sul?

GEORGE FREEDMAN

Os conceitos regionais. A influência consuetudinária.

EMERSON LINKS

A música eletrônica poderá acabar com o rock and roll?

GEORGE FREEDMAN

Não acredito nessa versão. Um é um e outro é outro. Os grandes momentos da música nunca perderão seu lugar.

EMERSON LINKS

Você concorda com a idéia de que, nos anos 90, o grande astro, a figura carismática do vocalista desapareceu e em seu lugar surgiu “a própria mídia” como o centro das atenções  (Por exemplo, nos anos 80, os vocalistas se sobressaiam como poetas, é o caso de Cazuza (Barão Vermelho), Renato Russo (Legião Urbana), Júlio Barroso (Gang 90). Nos anos 90, a figura do vocalista evaporou? Se acha que sim, dia o por quê.

GEORGE FREEDMAN

Não concordo “in totum”. Acho que nasceu o vocalista-empresa e, como tal, ele é fabricado para produzir lucro. O vocalista carismático surgirá nos entremeios. O problema é que atualmente as gravadoras querem lucro rápido e deixam de procurar valores como esses citados.


EMERSON LINKS

Todo crítico é um artista frustrado?

GEORGE FREEDMAN

O crítico expressa seu ponto de vista dentro do tema que lhe é apresentado. Se ele expressa negativamente sua opinião é porque o tema não lhe agradou. É a liberdade de expressão.

EMERSON LINKS

Deixe num espaço de, no máximo, dez linhas, palavras sobre o livro A BÍBLIA DO ROCK, que, também, trata-se de um longa-metragem, com imagens já captadas pelo cineasta Emerson Links, ao longo de 18 anos. Nenhum projeto do gênero teve tanto tempo dedicados à pesquisa e profundidade de campo de natureza biográfica.

GEORGE FREEDMAN

Todo testemunho gráfico é um documento para a posteridade. Essa sua iniciativa sua é digna, pelo projeto, pelo trabalho e pela pesquisa. Espero que tenha sucesso e que este livro se torne objeto de consulta para curiosos e estudiosos, levando a todos ciência de uma era de mais amor e menos violência, que desejamos um dia volte.



George Freedman mantém amizade com Emerson Links desde 1999.


George Freedman, num intervalo da primeira entrevista concedida para o longa-metragem. Crédito fotográfico: Euler Paixão. Copyright by Emerson Links. Atenção: O uso indevido desta foto em outra publicação sem autorização previa do autor estará sujeita as sanções previstas por Lei. 





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Um comentário:

  1. Links, para quem tinha ainda alguma dúvida do que foi, como começou, o que representava...termina aqui todas as dúvidas, sua materia está esplendida!! amei, a leitura tbm está maravilhosa!! parabéns por mais esta...bjjjjus

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